Muita gente está querendo ver cenas como esta em 2022
Reuters“As coisas não são como são. Elas são como parecem.” Ouvi essa frase quando, aos 20 e poucos anos, um ex-chefe tentava me explicar como "a vida funciona de verdade”. Eu não conseguia achar normal o teatro que estava sendo produzido na empresa para impressionar um cliente e foi essa a justificativa que ele me deu, rindo muito da minha inocência.
A questão é que o teatro funcionou, e o cliente caiu como um pato. E, quando um funcionário que não sabia do combinado saiu do script e falou a verdade, o cliente riu achando a colocação totalmente ridícula. Essa foi uma das primeiras decepções que tive na minha vida profissional, mas obviamente não foi a única, nem sequer a pior delas. Daí em diante, vi que esse não foi um caso isolado, mas, sim, uma prática bem comum em muitos segmentos, principalmente na publicidade e, infelizmente, no jornalismo.
A polêmica da vez é se o Carnaval deve ou não ser cancelado no Brasil por causa da quarta onda pela qual passa a Europa. Apesar de estarmos vivendo exatamente a mesma situação de 2020, quando o país ignorou o que acontecia no Velho Continente e todos pagamos caro pela negligência, vamos trilhando o mesmo caminho. Porém, desta vez, a narrativa mudou e deu origem a uma série de justificativas que, no fundo, não passam de desculpas mal formuladas.
Uma delas é que o país precisa aquecer a economia, tão devastada pelos lockdowns excessivos promovidos por políticos que diziam salvar vidas, mas nunca puderam comprovar a eficácia da medida. O que temos são apenas conjecturas de que “teria morrido mais gente” caso as medidas não tivessem sido tomadas. A verdade é que jamais saberemos. O que sabemos é que o discurso “a economia a gente vê depois” já quase não se ouve mais.
Outra desculpa é que “não há como impedir as pessoas de ir para a rua no Carnaval”. Isso chega a ser absurdo; afinal de contas, foi exatamente isso que prefeitos e governadores fizeram de norte a sul do país por meses a fio. Parece que a população já se esqueceu de que pessoas foram presas simplesmente por estar na rua, comerciantes foram multados ao tentar trabalhar, passageiros foram arrancados de dentro de ônibus pela polícia e portas de estabelecimentos foram soldadas para que, forçosamente, se mantivessem fechadas.
Dizer a verdade nesse contexto teatral é ser tachado de teórico da conspiração, terraplanista, negacionista. O certo é dizer que o vírus está nas igrejas, nas escolas e no comércio em geral, mas não frequenta de forma alguma blocos de Carnaval mesmo com milhares de pessoas aglomeradas e sem máscara. A ordem agora é não criticar o Carnaval, pois ele salvará a economia sem pôr sequer uma pessoa em risco. O Brasil realmente não é para amadores.
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