Há mais de 70 anos, em 26 de dezembro de 1951, a lei nº 1.521 entrou em vigor no Brasil e configurou o “esquema de pirâmide” ou “pirâmide financeira” como crime contra a economia popular. Pelos prejuízos que causa às vítimas a pena parece bastante branda: de 6 meses a 2 anos de detenção e multa.
Mas o esquema em si é ainda mais antigo. A fraude foi criada em 1910, por Charles Ponzi, um italiano que migrou para os Estados Unidos aos 21 anos de idade. Ponzi teve a ideia de oferecer juros de 100% em apenas 90 dias a quem entrasse no negócio e o fazia funcionar por um tempo usando o dinheiro de “investidores” novos para pagar os mais antigos.
Pirâmide financeira: prejuízos e crime contra a economia
Agência Brasil/Marcello Casal Jr.Para dar ao golpe um caráter de negócio sério, Ponzi usava parte do dinheiro para comprar selos postais de baixo custo em outros países e, com sua lábia de malandro, os revendia a preços bem mais altos nos Estados Unidos. Só dez anos depois da criação da fraude é que o jornal americano Boston Post começou a desconfiar e contratou um investigador para descobrir como era possível pagar retornos tão altos. A questão é que, simplesmente, era impossível.
A investigação chegou à conclusão de que, para que fosse viável pagar as milhares de pessoas envolvidas no esquema, seriam necessários mais de 160 milhões de selos, sendo que havia cerca de 27 mil em circulação. Diante da denúncia, as pessoas começaram a pedir seu dinheiro de volta e Ponzi acabou na cadeia. Mas, uma vez solto, ele criou outra estratégia para continuar aplicando o mesmo golpe: mudar de estado sempre que era descoberto.
De golpe em golpe, Ponzi foi preso por diversas vezes em vários estados americanos, até que decidiu vir para o Brasil. Por aqui, ele também fez vítimas, mas mesmo com todo dinheiro que ganhou fraudando milhares de pessoas ao longo de muitos anos, acabou falecendo na miséria em um abrigo para indigentes, em 1949.
Ponzi deixou um legado criminoso que persiste até os dias de hoje. O esquema continua exatamente o mesmo: oferecer altos ganhos sempre de forma rápida, fácil e garantida. Para angariar mais vítimas não é preciso muito esforço, pois o conhecimento financeiro de grande parte dos brasileiros, infelizmente, beira o analfabetismo.
Mas mesmo para os mais desconfiados, as quadrilhas justificam a façanha de várias formas. Cada golpista dá uma cara nova à velha fraude, seja mudando o formato “triangular” do esquema com imagens circulares, travestindo-se de cooperativa de investimento ou corretora de criptoativos e até mesmo partindo para o misticismo, com as “mandalas da prosperidade” ou o uso de figuras da “mãe natureza”.
Mas a questão é que os principais elementos da natureza humana que mantêm a fraude viva há mais de um século são a ganância e, digamos, a ingenuidade, para usar uma palavra mais leve. Como educadora financeira há mais de uma década, perdi as contas de quantos alertas já fiz e quantas listas de dicas para não cair no esquema já publiquei.
Curiosa e invariavelmente, o retorno ofensivo por boa parte do público sempre acontece, ou seja, nunca faltam pessoas para defender quem as defrauda e para insultar quem tenta alertá-las. É como dizem por aí: todo dia um malandro e um trouxa saem de casa, se eles se encontram, negócio fechado.
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